Orações pouco espirituais

Dou graças a Deus por Ele não ter retirado alguns Salmos da Bíblia, principalmente os que mostram os sentimentos "pouco espirituais" (como dizem os crentes de hoje em dia) do Salmista.

Ir-me-ia sentir mal se eles lá não estivessem, pois muitas vezes sinto coisas "pouco espirituais" e iria pensar que era a única ou que fazia parte daqueles tristes desgraçados que não conseguem viver a verdadeira vida espiritual.

O Salmista disse coisas como:

"Deus, tu rejeitaste-nos e desbarataste-nos."

"Meu Deus, porque me abandonaste?"

"Chamo de dia e não me ouves, meu Deus; e de noite é a mesma coisa: não tenho resposta e não consigo sossegar."

Quase consigo imaginar as respostas "espirituais" que David devia ouvir se dissesse estas coisas nos nossos dias. As respostas do tipo das dadas pelos amigos de Job.

"Deus não te abandona, não tenhas falta de fé! Porque dizes que Deus não te ouve? Que falta de fé da tua parte. Não consegues sossegar? Não sabes que a paz que Deus dá é real? Tu é que estás mal."

Por mais que algumas das respostas contenham a verdade ou parte dela, porque temos nós tanto problema em exteriorizar aquilo que sentimos de verdade?

Nos últimos tempos tenho tido conversas com Deus "pouco espirituais." Daquelas coisas que não "ficam bem" dizer ao pé dos outros, ou pensariam que estava desviada.

Cheguei a dizer a Deus que me arrependia de algo que Lhe tinha pedido, pois o que vivo é simplesmente a resposta a algo que Lhe pedi. E por mais que esteja a ser bom e tão produtivo aquilo que vivo, Ele sabe que o meu comodismo Lhe diz:

"Ó Deus, não achas que já chega? Dá-me um pouco de descanso! Já aprendi o que me queres ensinar, agora apressa as coisas!"

Mas não, Deus insiste que eu viva uma situação difícil e, ainda por cima, prolongada, lenta, lentíssima em se resolver.

Apesar de tudo, sorrio. Porque sei que está a ser produzida tanta coisa boa no meu interior. Sorrio porque consigo ter um vislumbre da razão de tudo isto. Sorrio porque Deus é fiel e amoroso comigo e porque responde ao que Lhe peço, ainda que as respostas que Ele me tem dado não sejam as que imagino quando Lhe faço os pedidos.

E o meu coração está grato. Faço minhas as palavras de Maria:

"Dependo só do Senhor. Que se faça em mim segundo o que disseste. Que aconteça comigo tudo o que disseste." Lc 1:38

E muitos Salmos "espirituais" eu já poderia escrever com tudo o que já tenho vivido com o Senhor.

Obrigada, Paizinho, porque Tu és o meu maior amor.

Esperar... esperar... esperar...

"Esperei com paciência que Deus me socorresse; então Ele ouviu-me e atendeu ao meu apelo. Tirou-me dum poço de desespero, dum charco de lodo, e pôs-me os pés sobre uma rocha, fez-me andar num caminho seguro.

Deu-me, para cantar, um novo cântico de louvor ao nosso Deus.

E agora muitos poderão ouvir as coisas maravilhosas que Ele fez por mim, e porão, por sua vez, igualmente a sua confiança no Senhor." Sl 40:1-3



Esperar com paciência...


Estes versículos são para mim muito especiais, ainda mais ultimamente.

Ando a esperar com paciência que Deus me socorra.

Se é preciso paciência para esperar, é sinal de que a espera é longa, significa que o socorro de Deus não tem sido imediatamente visível.

Algumas vezes o socorro de Deus tem sido imediato na minha vida e eu adoro-O muito quando isso acontece, mas quando esse socorro é lento, invisível aos meus olhos, o meu coração quebranta-se muito mais, depende muito mais d'Ele, aprende a chorar no Seu colo, a estar mais tempo diante do Trono.

Isto é o que tenho vivido. Uma espera longa para a qual eu preciso ter a paciência divina de esperar, aquietar-me e ver Deus a agir, ainda que os meus olhos não vejam nada, não vislumbrem nada a acontecer.

Nunca vivi isto com tanta intensidade como nos últimos meses. Depois de tantos anos de cristã parece que só agora ando a aprender a confiar plenamente.

Plenamente... totalmente... inteiramente... ainda que tudo pareça contrário.

Uma vez ouvi que Deus quer de nós o tipo de fé ilustrado no seguinte exemplo: nós vamos andando e vemos ao longe uma porta automática, daquelas que se abrem quando nos aproximamos dela, por causa do sensor que têm. Fé é ir mesmo vendo essa porta fechada, crendo que quando eu chegar perto dela, ela vai-se abrir.

Em todo este tempo Deus tem-me levado a destronar muitos sentimentos e pensamentos errados que tinha no meu coração. Para serem purificados, têm de estar a ser provados pelo fogo, como um metal que fica mais puro.

Tudo o que ando a viver é resposta que Deus deu a alguns pedidos que Lhe fiz. Quando me apercebi disso, o meu coração tremeu. Deus está a responder mas não da forma que eu queria, que eu imaginava. Quase me arrependi do que pedi, pois a resposta que Ele me deu não é fácil, não é leve. Mas é nestas alturas que posso experimentar como o Seu jugo, esse sim, é leve.

Ao passar por esta prova, sinto-me já diferente. Está a produzir coisas no meu interior que eu não sei explicar mas que eu sei que são aquele tipo de coisas profundas, que vão servir de alicerce para algo mais que virá depois.

Está e continua a colocar os meus pés sobre uma rocha. Mais firmes, menos hesitantes, menos errados. Uns pés mais dependentes.

Agradeço a Deus tudo o que tenho vivido. Ele sabe que eu preferia não viver o que estou a viver, pois a minha carne diz-me isso. Mas no meu espírito eu sei que é o melhor para mim, por isso muitas vezes eu apenas Lhe digo: "Tu sabes todas as coisas. Adoro-Te."

Escrevo tudo isto aqui por algum motivo. Que Deus seja o Teu consolo também, tu que lês estas palavras e precisas do consolo e paz vindas de Deus. Que usufruas d'Ele como Pai.

Sinto-me...

... talvez como Elias se sentiu após a sua grande vitória sobrenatural no Monte Carmelo.

Sempre que penso em Elias e nesse acontecimento, penso que se fosse eu a viver tudo aquilo, eu já não duvidaria de nada.

Depois de ver e assistir Deus a agir na minha vida em coisas que estavam a ser difíceis para mim, senti o mesmo: "Eu não vou mais duvidar de que Tu ages, Deus."

Mas o que é certo é que duvido.

Tal como Elias fugiu "apenas" de uma ameaça, a mim também me apetece fugir um pouco de Deus. Talvez não fisicamente, mas interiormente, ficando no meu canto. Pensando n'Ele, de vez em quando, apenas...

Até hoje penso neste sentimento... o meu e o de Elias... as grandes vitórias deveriam levar-me para mais perto de Deus. E levam, temporariamente, mas passado uns tempos parece que me esqueço de tudo o que vivi.

Não escrevo tudo isto com um discurso derrotista. Escrevo com o coração contristado porque me vejo, por vezes, interesseira com Deus. Quero agir por amor e sinto, aos meus olhos, algum amor por Ele, mas quando tudo está bem na minha vida, parece que esse amor diminui. Já não preciso tanto desse amor porque a vida que levo aqui na terra é uma vida feliz. Graças a Ele, não a mim.

Hoje, com o coração apertado, orei: "Deus, perdoa-me porque não falo contigo por amor mas por interesse."

Sei que foram palavras jogadas no momento, que nem sempre é assim pois o meu coração muitas vezes anseia por Deus, não pelo que Ele faz, mas há uma ponta bem grande de interesse no meu interior.

Neste momento tenho medo de pedir o que tantas vezes já pedi a Deus: "Quero conhecer-Te mais, quero chegar mais perto de Ti, quero ver-Te, quero viver com mais intimidade contigo."

Hoje começo a ter uma ténue ideia do que essa oração implica e não me sinto preparada para viver tudo isso.

Uma melodia minha conhecida ecoa na minha mente há semanas:


"Ainda existe uma cruz p'ra você carregar
Não se deixe enganar, a porta é estreita
O caminho é árduo para você trilhar
Não se deixe enganar
Ainda existe uma cruz,
ainda existe um preço a pagar."


Sou muito indigna de viver seja o que fôr no mundo espiritual. O meu amor é fraco, a minha dependência não é constante, a minha visão perde-se com facilidade.

Quem sou eu diante de Deus para que Ele se lembre de mim?

Sua filha doente, porque afinal Ele veio para os que estão doentes. Os sãos não precisam d'Ele. Eu preciso.